Possession - A.S. Byatt

There are things that happen and leave no discernible trace, are not spoken or written of, though it would be very wrong to say that subsequent events go on indifferently, all the same, as though such things had never been.” 
'Possession', A.S. Byatt

Para quem procura um livro completo, recheado de emoção e de personagens inesquecíveis, 'Possession' é sem dúvida uma aposta ganha. Nas suas mais de 500 páginas leva-nos numa viagem ao passado, de descoberta, e sobretudo a uma história de amor em várias épocas que continuará a inspirar gerações futuras de leitores.

'Possession' acompanha dois investigadores literários e a sua descoberta de uma ligação (secreta até à data) entre dois poetas que são o objecto de estudo de cada um deles: Roland Mitchell e Maud Bailey, que estudam, respectivamente, os poetas Randolph Ash e Christabel LaMotte. Um romance que pode ser definido como um mistério intelectual (quase policial, por entre as linhas da literatura) e uma história de amor (que se espelha também no presente).

A.S. Byatt enche a sua escrita de génio e perspicácia na forma como nos leva do presente ao passado, mas também como transforma este presente de acordo com as descobertas do passado. Tanto Maud como Roland vão lendo os escritos deixados pelos poetas da sua adoração e vivendo as mesmas coisas que estes experienciaram em tempos, na busca pela verdade e pela história, e ao mesmo tempo procurando encontrar os seus próprios "eus" por entre tamanha dedicação às vidas dos outros.

“I cannot let you burn me up, nor can I resist you. No mere human can stand in a fire and not be consumed.”
À complexidade deste jogo de espelhos alia-se a densidade de camadas narrativas que 'Possession' engloba, num romance que nada tem de simples e linear. Dentro de um só livro há poesia, escritos académicos, contos, cartas e diários, para além da prosa do romance. São mais de 100 páginas diarísticas inventadas pela autora, como se às suas personagens pertencessem, e mais de 1700 linhas de poesia original, também da sua autoria, atribuída contudo aos poetas centrais da obra romanceada.

Há em todas estas formas de escrita e ao longo de toda a obra questões muito pertinentes e relativas à sociedade inglesa da época que são abordadas com muita inteligência por parte da autora, como a questão do feminismo, a questão o adultério (numa época e numa sociedade ainda mais antigas) e abusa a questão dos direitos de autor (e a quem pertencem após a sua morte). As histórias - do passado e do presente - são ainda acompanhadas por uma escrita muito emocional, que por vezes rasga o humorístico e o satírico, com um claro objectivo de crítica social e dos estereótipos do mundo académico britânico.

É, por tudo isto, uma verdadeira aventura deixarmo-nos levar por este romance denso, muito criativo e voraz, que nos faz querer saber sempre mais sobre a história destes dois poetas que ninguém sabia terem-se conhecido sequer, e em simultâneo precisamos de tempo e atenção para seguir tudo o que as personagens de Byatt nos querem contar, tudo o que a autora criou para as suas personagens. Tanto Ash e LaMotte como Maud e Roland são personagens e romances com espírito e muito bem modeladas, o que as torna emocionantes e idolatradas aos nossos olhos.

Daqueles romances cujo final (talvez um pouco piroso) nos deixa de lágrima ao canto do olho e cuja recordação estará muito para lá das páginas dobradas com as frases favoritas, mas sim espalhada por toda a história e todas as palavras das personagens que nos tornaram pessoas um pouco mais conscientes do mundo e da necessidade de aproveitar a liberdade da vida.

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