A Amiga Genial - Elena Ferrante

"Perguntei-me o que fazia eu naquele automóvel. Estavam ali os meus amigos, é certo, estava o meu namorado, íamos para a festa do casamento de Lila. Mas essa festa, precisamente, confirmava que Lila, a única pessoa de quem eu ainda precisava apesar das nossas vidas divergentes, já não pertencia àquele mundo, e, faltando ela, qualquer ligação entre mim e aqueles jovens esgotara-se. Então porque não estava na companhia de Alfonso, com quem partilhava a origem e a fuga? E, sobretudo, porque não me detivera para dizer a Nino: fica, vem ao copo-d'água, diz-me quando sai a revista com o meu artigo, vamos falar os dois, vamos escavar uma toca que nos ponha à parte desta forma de conduzir de Pasquale, da sua vulgaridade, dos tons de voz violentos de Carmela e Enzo, e também - sim, também - de Antonio?"
'A Amiga Genial', Elena Ferrante

A especulação em torno da suposta "maravilhosa" escrita de Elena Ferrante, e sobretudo em torno da sua identidade desconhecida, elevou a minha curiosidade ao ponto de me levar a comprar o primeiro livro da tetralogia na Feira do Livro deste ano. E agora, ainda que não me tenha apaixonado do início ao fim, chatice máxima: fiquei com curiosidade de ler os restantes.

'A Amiga Genial' acompanha a infância e a adolescência de duas amigas de um bairro popular nos arredores de Nápoles: Elena Greco e Lila Cerullo. Conhecem-se na primeira classe e separam-se mais tarde quando Elena segue o seu percurso escolar e Lila não, ficando a trabalhar para o pai sapateiro e procurando ajudar a família. Se na infância Lila era sempre a melhor na escola, na adolescência vai ser a mais bonita e preferida pelos rapazes, o que leva sempre Elena a sentir-se inferior a ela, invejosa da sua magnificência e ao mesmo tempo quase obcecada pela sua personalidade corajosa. Mas é ela que permanece, para Lila, a sua eterna "amiga genial".

É de forma gradual, na primeira pessoa e com uma escrita simples mas sentimental, que Elena Ferrante nos leva pela história das duas meninas já quase mulheres, que crescem em caminhos diferentes mas nunca deixam de gostar uma da outra e de se assemelhar de certa forma: ambas cultas, inteligentes e com vontade de aprender sempre mais para se superarem a si mesmas (e talvez uma à outra?).

Nestas fases de crescimento - até um final totalmente em aberto para as próximas "aventuras" da vida de Elena e Lila - sofrem desilusões, vivem experiências que lhes mudam a vida, voltam a cruzar-se com pessoas do passado e sobretudo tentam encontrar o seu próprio caminho num bairro pobre, em famílias pobres que apenas procuram trabalhar para sobreviver, num ambiente dominado pelas intrigas do passado. A sua busca de conhecimento e de um lugar diferente daquele a que parecem pertencer fá-las viver tudo de forma muito intensa e ajuda-nos a identificar-nos com os episódios que Elena vai relatando.

Esta primeira obra das quatro que compõem a história completa da Amiga Genial é ainda muito iniciática, parece-me, do que Elena Ferrante pretende mostrar nesta história de uma vida. Há paixões, amizades, obsessões e invejas desde a infância das duas raparigas, mas o livro termina exactamente como podíamos esperar de uma obra em quatro volumes: em aberto, no meio de uma cena importante para a história, numa inconclusão que nos obriga a procurar respostas nos livros seguintes.

Julgando apenas por este primeiro volume, não me parece fazer muito sentido o hype em torno de Elena Ferrante. A sua escrita, ainda que pessoal e sentida, não traz nada de novo à literatura contemporânea. A história leva-nos na corrente pela facilidade com que nos é mostrada e com que nos identificamos com alguns episódios da sua infância e adolescência, mas nada mais do que isso. Entretém, lê-se rapidamente e de forma interessada, se formos sem expectativas e com vontade e curiosidade de conhecer a autora. Talvez também não pretenda ser mais do que isso mesmo!

Comentários

  1. Já li todos e adorei, o ultimo volume foi um soco no estômago do qual nunca recuperei!!! Agora tenho de ver a série!!!

    ResponderEliminar

Enviar um comentário