Chernobyl: A Zona - Bustos e Sánchez
Novelas gráficas com cunho jornalístico. Havia muitas formas de descrever e homenagear as vítimas da explosão nuclear de Chernobyl, 30 anos depois. Mas poucas conseguiriam fazê-lo de forma tão simples e sentimental como esta banda desenhada negra, crua e introspectiva.
'Chernobyl: A Zona' segue uma família em três gerações - e os efeitos que Chernobyl teve nas suas vidas. Leonid e Galia vivem perto da central nuclear, acabam por ser obrigados a abandonar a zona quando as aldeias mais próximas são evacuadas devido às fortes radiações, mas regressam anos depois à sua casa e voltam a cultivar num terreno altamente infectado, como alguns resistentes que não quiseram morrer longe de casa. A filha, Anna, perde o marido na explosão e, grávida, tem também de encontrar uma nova vida com o filho Yuri e Tatiana, a criança que carrega, longe de tudo o que sempre conheceu. Anos depois é Yuri que regressa a Chernobyl com a irmã, ela em busca de saber mais sobre o passado, ele de reencontrar de alguma forma a infância perdida.
O traço negro, a quase ausência de falas e pensamentos e o foco nas consequências e nas vítimas do desastre nuclear, em lugar das suas causas, da sua visão mais política por assim dizer, tornam esta novela gráfica verdadeiramente tocante. Não é preciso dizer o que se consegue mostrar por imagens tão simples e cruelmente belas como as que a ilustradora aqui integrou. O argumento, a história familiar, desenvolve-se plenamente neste género literário e imagético sem necessidade de qualquer complemento.
O objectivo seria, claro, chamar a atenção dos que conhecem e dos que não sabem todos os pormenores de uma das maiores tragédias do século XX para os perigos da radiação nuclear, para a falta de informação das populações vizinhas da central, e para o sofrimento que as famílias - e gerações e gerações dos habitantes de Chernobyl e até de locais mais distantes que também foram afectados pelas radiações - tiveram (e ainda têm) de atravessar.
Seria, também, objectivo dos autores homenagear todos os homens e mulheres anónimos que deram a vida não só no momento da explosão, como depois, na prevenção de outras consequências devastadoras, na aniquilação de qualquer possível reactivação da explosão - os chamados 'liquidadores', 'robôs' tratados abaixo de cão responsáveis pela limpeza do local.
O que consegue é, na verdade, muito mais do que tudo isto. É uma história ficcionada que nos transforma de forma muito fiel e visual para uma realidade que não vivemos, e que passamos a conhecer por dentro. Até porque não é uma tragédia datada; não faz apenas parte da história. Pode voltar a acontecer a qualquer momento, em qualquer uma das mais de 400 centrais nucleares actualmente activas em todo o mundo, sem que dê sinais disso. Sem que a nossa memória seja, como a das vítimas desta tragédia, preservada.
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