A Idade da Inocência - Edith Wharton
“Eu nunca a seduzi – exclamou -, e nunca o farei. Mas você é
a mulher com quem eu teria casado, se isso fosse possível para qualquer um de
nós."
'A Idade da Inocência', Edith Wharton
É terrível quando os códigos sociais impelem as pessoas a agir de determinada maneira ou as proíbem de viver como bem entendem. Edith Wharton viveu-o na pele, na sociedade americana do século XIX, e critica-o de forma aguçada e inteligente neste 'A Idade da Inocência'. Inocência dos que vivem na ignorância de serem constantemente condicionados pela tradição, pela educação, mas também daqueles que, sabendo-o, ainda assim anseiam e acreditam conseguir escapar-lhes.
Newland Archer é a figura central da história, noivo de May Welland, uma jovem de boas famílias por quem está absolutamente apaixonado. No entanto, o regresso da Condessa Olenska, após fugir do marido europeu, vai perturbar o mundo convencional e sensível da sociedade novaiorquina, levantando questões e ferindo convicções que Archer nunca vira abaladas.
“Que podiam eles realmente saber um do outro, já que era seu
dever como um homem ‘decente’ ocultar o seu passado e o dela como uma menina
casadoura não ter passado a esconder? (...) “O coração deu-lhe um salto, pois viu que estava a dizer
todas as coisas que jovens na situação dele deviam dizer, e que ela dava as
respostas que o instinto e a tradição a tinham ensinado a dar, até mesmo ao
ponto de lhe chamar original.”
Inicialmente, de facto, o próprio Archer abomina Ellen Olenska pelo seu desrespeito pelas normas, pela sua ignorância do "dever". Ao mesmo tempo, gostava que May não seguisse estas mesmas normas tão à risca - que ela fosse mais determinada, menos igual a todas as outras mulheres de bem da sociedade. E é isso que, aos poucos, vai descobrindo em Ellen: uma mulher diferente, que já vira outras realidades, apaixonada pela arte e pela vida, e não fechada no seu mundo. E é isso que o atrai nela.
Nem sequer lhe podemos chamar romance; é um pseudo-romance, uma história de amor que nunca o chega a ser efectivamente porque não dá, porque não pode ser. Vivem na memória um do outro e isso acaba por ser suficiente. Há uma certa resignação a esta vida que não escolheram, ou na qual fizeram as escolhas erradas mas irreversíveis. A verdade é que não há nada a fazer senão viver a vida possível.
“A jovem serena, quase passiva pareceu-lhe exactamente o
género de pessoa a quem as coisas estavam destinadas a acontecer, não importa o
quanto ela se afastasse delas e fizesse tudo para as evitar.”
Com uma escrita subtil, muito curiosa, Edith Wharton mostra-nos esta elegância de Nova Iorque, os escândalos que de um momento para o outro transformam um homem de bem num monstro, imediatamente abominado por todos, a forma como uma mulher é mal vista por ter deixado o marido ainda que este a tratasse mal. E no meio de tudo isto há um homem lúcido, que se apercebe da clausura em que vive, ao mesmo tempo em que uma mulher se tenta voltar a integrar numa sociedade na qual não se reflecte e que apenas a enclausuraria ainda mais.
É de uma beleza enorme a forma como somos levados pelas páginas de duas vidas condicionadas pela época - e como, no final, tudo faz sentido. Como nos apercebemos que, logo na geração seguinte, a sociedade começa a ser mais aberta e menos orgulhosa. E como Archer nunca deixou de ser um homem feliz por Ellen viver no seu pensamento. Pulitzer pela "crónica dos costumes", é absolutamente recomendado :)
O filme:
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