Sensibilidade e Bom Senso - Jane Austen
"Minha querida Elinor. Não deixes que a tua bondade defenda o que a tua razão deve censurar."
'Sensibilidade e Bom Senso', Jane Austen
'Sensibilidade e Bom Senso' é a história de duas irmãs com caracteres diferentes, mas mais parecidas do que parecem e se consideram. No seu primeiro romance, Jane Austen abre as portas ao seu mundo, à sociedade do seu tempo, e sobretudo à sua capacidade de contar histórias. Com muito bom senso, mas sobretudo com muita paixão e sensibilidade.
Elinor e Marianne são duas das filhas de Mrs. Dashwood, jovens com pouca riqueza mas muita personalidade. A primeira, mais velha, mais sensata, é a voz da razão tanto da irmã mais nova, sempre instintiva e emocional, como da mãe, de quem Marianne herdou este carácter. Apesar de naturalmente mais alegre e expressiva, é vulnerável no que toca às questões do coração. Mas Elinor, apesar da sua sensatez, da sua ponderação, também não escapa aos amores e desamores que Jane Austen retrata no livro. Por Edward e Willoughby, apesar de todas as aparentes certezas que lhes são dadas, as duas raparigas acabam por sofrer por amor.
É pouco mais do que uma história banal, esta sua procura de um casamento por amor, apesar de todas as condicionantes económicas e sociais. Mas é esta sociedade em que esta situação tão específica se encontra envolta que nos leva a querer saber mais sobre estas personagens e o seu desfecho - porque nos parece insólito, muitas vezes, que um homem abdique do amor em nome da riqueza, por exemplo, ou porque acreditamos que as nossas personagens vão conseguir ultrapassar todos os obstáculos e viver a vida que pretendem. Pelo menos assim queremos acreditar.
"Eu não sabia a extensão da ferida que provocava, porque então eu não sabia o que era amar. Mas alguma vez o soube?... Bem, podemos duvidar disso, porque se realmente eu tivesse amado, teria sacrificado os meus sentimentos à vaidade, à avareza?... Ou, o que ainda é pior, teria sacrificado os dela?... Mas fi-lo."
Claro que tudo isto torna a história algo previsível, mas é aí que, mais uma vez, entre o génio de Austen, a levar-nos por estranhos caminhos até encontrarmos a felicidade - das personagens e nossa. Os estereótipos da riqueza fácil, dos defensores de um reduzido papel social para a mulher, daqueles que consideram qualquer acção em nome próprio uma traição familiar. Há muitas pessoas com falta de carácter - ou com excesso dele - que existiam na época, mas que também encontramos diariamente no mundo em que vivemos. Daí que este tipo de romances, apesar de este já existir há 200 anos, nunca percam a actualidade.
Curioso é que, ainda que a história de ambas as irmãs seja tratada de forma igualmente importante, parece ser Elinor a favorita da autora, seguindo sempre os seus pensamentos, os seus sorrisos e infortúnios. O conhecimento de Marianne é, inclusivamente, feito através dela. E a sua sensatez acaba por permitir contar a história de modo racional, ponderado, mais tranquilo. Talvez tenha sido por isso que Austen a escolheu... facto é que acabamos por nos afeiçoar mais a ela, por conhecermos melhor o seu coração.
"Oh! Elinor, como são incompreensíveis os teus sentimentos. Acreditas mais depressa no mal do que no bem. (...) Não podemos aceitar probabilidades apenas porque não são certezas? Será que nada devemos ao homem que tantas razões temos para amar e nenhuma para ter má opinião? Não haverá possibilidade de os seus motivos serem inexplicáveis, por causa de um segredo agora inevitável?"
No entanto, algo que retiro de 'Sensibilidade e Bom Senso' é a capacidade que todos temos de ter (vá, particularmente as mulheres) em equilibrar as duas personalidades, apaixonada e sensata, de Marianne e Elinor. A própria irmã mais nova reconhece, a certa altura, o seu comportamento nem sempre correcto perante os outros e a falta que lhe fazia ser um bocadinho como Elinor. A importância desta mulher é também aqui destacada, por ser a mais correcta socialmente, não deixando de ser também apaixonada, emotiva, triste e contente conforme a situação - é, contudo, a que melhor consegue contrabalançar o que sente com o que pensa, sem elevar demasiado as expectativas e sofrer, ou vice-versa.
Foi o meu terceiro 'Austen', dos três talvez o que menos gozo me deu a ler, pela previsibilidade, pelo conhecimento do filme homónimo, pela escrita não tão estilisticamente brilhante de Austen, embora sempre com um talento enorme para despertar em nós a emoção. Chegando ao fim e reflectindo, no entanto, compreendi que não foi em vão que o li. Aprende-se sempre com a maravilhosa Jane e os meandros do seu coração.
Ainda só li o Pride and Prejudice, mas depois de ter lido essa primeira quote, veio-me logo à cabeça a Lizzy a falar para a Jane ;)
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